Que se emplee el que es
discreto
En hacer un buen soneto,
Bien puede ser;
Mas que un menguado no sea
El que en hacer dos se emplee,
No puede ser.
Don Luis de Góngora y Argote
Plumas
e voz de um pássaro-mulher,
Pediu
a um ancião Yantl as chaves
De
ornitófilas artes, e os arcanos.
–
Alenta-lhe com beijos, disse o velho,
A
voltívola alma. E a tal conselho
Juntou
ciência de idades e dos anos:
– “Beijos
nas asas, sim, mas também pô-los
Em
mãos e coração, que mais dilatam
As
almas fêmeas do que versos tolos,
E
em deixá-los, sobretudo, esmera,
À
mulher-pássaro, onde desatam
Os
cânticos e os dons da primavera”.
Se
tratas de escapar, assim, aos frios
Primeiros
do outono de um coração
Antigo,
feito ao seu destino, um rio,
Resigno-me
ao teu lúcido alvedrio,
Que
deixes para trás uma estação
Sombria
e gélida, o plúmbeo vazio,
Pelas
auroras cálidas de verão!
Guiem-te,
lépidas, mulher-hirundina,
As
mais gentis e mais suaves correntes,
A
enseada azul de águas transparentes.
Tuas
claras manhãs, ave peregrina,
Saúdem,
cordiais, delfins reverentes:
–
“Tenhas um lindo dia, ave-menina!”
(Rib.
Preto/1967)
Pode ser que o primeiro texto tenha sido postado neste O&B, mas já faz tempo. A
nova postagem é mais pra não perder a oportunidade da epígrafe de Góngora.
No mesmo jogo de oportunismo, o blogueiro achou uma jóia barroca do poeta cordobês
no magnífico livro “Góngora y el Polifemo”, de Damaso Alonso. Aí, a refinada
ourivesaria e a ornitologia mais sutil, embora em brevíssima referência, ao rouxinol, no caso, o primor das imagens, exerceram influxo irresistível para que se impusesse nesta nota. Os versos são de 1609, mas O&B nunca teve conceitos
muito claros de atualidade e, no fim das contas, poesia é assim mesmo. Passemos ao rouxinol de Góngora:
“prodígio dulce que corona
el viento,
en unas mismas plumas
escondido
el músico, la musa, el
instrumento.”
Não
sei de quem é a foto da andorinha; a da coruja é do Daniel Esser , que acaba de
voltar de Afonso Cláudio, Espírito Santo, ande andou fotografando passarinho:
(NM)