segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Do tempo das coisas e dos homens

Ocioso e gratuito é dizer que o Eclesiastes é o texto mais citado, mencionado, referido, glosado, parafraseado etc. Mas essa é uma idéia que ocorre quando  a gente recebe algo como a “canzone meravigliosa” enviada pelo  ítalo-mineiro Fernando Fabbrini: “C`era un tempo”, de Ivano Fossati, a letra mais o enlace pra gente ouvir na voz do próprio autor.  “Tutto meraviglia”.

É uma cifra do Tempo, aquela história de um tempo pra plantar, um pra colher, um de chorar outro de rir, um tempo de edificar outro de destruir, por aí afora. Não dá pra gente saber se o tempo é o algoz do homem ou se, ao fim e ao cabo, o que o liberta, posto que, implacável, sobrepõe-se à vida e a todas as misérias da condição humana. Mas o autor do texto original, Eclasiastes, Pregador, ou Qohélet, na Tradição, deixou envolto em poéticas brumas apenas os tempos intermédios, muitas dúvidas. Seria o mesmo rei Salomão, filho de David, construtor do Templo, sábio amante da inefável Belquis, glória dos femininos reinos e, de todas as Abissínias, eternamente rainha.

No tálamo dourado do grande rei, ardor e langor da África, fulgentes tetas, o grato negror, tons e brilho da turmalina que, mesmo quando não excede em tamanho um grão miúdo de café, pode guardar muitos mistérios da noite. Brandas almofadas, tapetes da Babilônia, algodão do Egito; linho, lãs da Caxemira, seda de Samarcanda, muita seda...  E essências do Oriente, cravo, jasmim, mirra, incenso, benjoim...

Em tempo de triunfo assim, nem o filho de Davi haveria mesmo de acreditar no fim. Tempo de triunfo é só um átimo, um momento, um sopro, impossível, embora, de esquecer, e o rei Salomão, jamais, nunca esqueceu Belquis. “À égua do carro de Faraó te comparo, minha amada”, a lembrança dela tocando-lhe a pele e o espírito, feito a sombra da Águia do Destino que , capricho do Sol da África, vagueia sobre os vales crestados
enquanto, poderosa, a ave perscruta a glória, as agruras, vicissitudes, da Etiópia.

Mas o tempo é um, é dois, é três, feito as maçãs que um menino fanho vendia numa esquina do Centro de BH, ou de Bagdad, não me lembro, é múltiplo, vário, tempo a montante da ponte, a jusante do amanhecer, ao Sul das minas de Minas, ao Norte da Lua Nova, e além, muito além, da Grande Ursa e da Polar Estrela, Aldebarã mirando distraída, tempo de gafanhoto estrábico, do mico-leão dourado, da branca pomba indo embora, muita andorinha no céu.

E, no entanto, de mansinho, feito uma silenciosa mariposa, ou ex-abrupto, chega o tempo de morrer. Não liga não, pior é o tempo do espanto e o da desolação, o Tempo do Medo e da Tristeza, que a gente festeja enquanto não chega. Regozijemo-nos, rejubilemo-nos, abramos ao gáudio e à alegria as portas e janelas de nossas casas e a do coração e, como em antiga canção piedosa, “cantemos ao amor dos amores”, enquanto não se esgota “o tempo que sobre a Terra nos foi concedido” a que se refere Brecht no poema “Aos que virão depois de nós”.

E quando “A Última passar com seu facão”, é sorrir para ela,  acolhê-la como a anunciadora do Tempo do Esquecimento, deixar-se tocar pela lembrança de Belquis a assombrar o espírito feito assombra os vales e montes sabeus a sombra da Águia do Destino. E esquecer vinganças, remorsos, a roseira e os espinhos, as pedras do caminho, e até mesmo – Que pena! aqueles versos de Neruda, tão doídos, os de Dario, som de águas altas, cristalino fulgor...  E sorrir e deixar levar. (NM)

Agora, a  “canzone meravigliosa” que o Fabbrini mandou:

"C'era un tempo"

Ivano Fossati

Dicono che c'è un tempo per seminare
e uno che hai voglia ad aspettare
un tempo sognato che viene di notte
e un altro di giorno teso
come un lino a sventolare.

C'è un tempo negato e uno segreto
un tempo distante che è roba degli altri
un momento che era meglio partire
e quella volta che noi due era meglio parlarci.

C'è un tempo perfetto per fare silenzio
guardare il passaggio del sole d'estate
e saper raccontare ai nostri bambini quando
è l'ora muta delle fate.

C'è un giorno che ci siamo perduti
come smarrire un anello in un prato
e c'era tutto un programma futuro
che non abbiamo avverato.

È tempo che sfugge, niente paura
che prima o poi ci riprende
perché c'è tempo, c'è tempo c'è tempo, c'è tempo
per questo mare infinito di gente.

Dio, è proprio tanto che piove
e da un anno non torno
da mezz'ora sono qui arruffato
dentro una sala d'aspetto
di un tram che non viene
non essere gelosa di me
della mia vita
non essere gelosa di me
non essere mai gelosa di me.

C'è un tempo d'aspetto come dicevo
qualcosa di buono che verrà
un attimo fotografato, dipinto, segnato
e quello dopo perduto via
senza nemmeno voler sapere come sarebbe stata
la sua fotografia.

C'è un tempo bellissimo tutto sudato
una stagione ribelle
l'istante in cui scocca l'unica freccia
che arriva alla volta celeste
e trafigge le stelle
è un giorno che tutta la gente
si tende la mano
è il medesimo istante per tutti l'istante in cui scocca l'unica freccia
che arriva alla volta celeste
e trafigge le stelle
è un giorno che tutta la gente
si tende la mano
è il medesimo istante per tutti
che sarà benedetto, io credo
da molto lontano
è il tempo che è finalmente
o quando ci si capisce
un tempo in cui mi vedrai
accanto a te nuovamente
mano alla mano
che buffi saremo
se non ci avranno nemmeno
avvisato.

Dicono che c'è un tempo per seminare
e uno più lungo per aspettare
io dico che c'era un tempo sognato
che bisognava sognare.