O Lélio Fabiano dos Santos resolveu contar histórias. Uma que caiu na rede de O&B o blogueiro ocioso resolveu postar.
- Posso?
- Claro que pode, anuiu de pronto o velho amigo.
Então, o blog, alegremente, compartilha “O salto”, pequeno lavor de ourivesaria do Lélio, que anda meio sumido na bruma ingrata desses mares pandêicos, mas vocês podem ver pela foto que ele mantem-se firme no curso, sobrepujando as vagas com a galhardia e altivez de sempre, quarentenado e vacinado, longe, longe, a Peste e outras procelas. (nm)
O sol de fim de outono e do começo do inverno no hemisfério sul deveria ser festejado como nas antigas civilizações, com datas para celebrar e reverenciar os astros da galáxia que se enleavam à multiplicidade de seus deuses. Nosso planeta era mais cósmico e parecia relacionar-se melhor com aquela penca de estrelas que nos são apresentadas desde os milhares de séculos até onde os estudos e a imaginação alcançam e que nos iluminam há tantas e quânticas eras.
A linda manhã outonal animou Carlos ao passeio naquela tarde, como vinha se prometendo fazia tempo. Ziguezagueou por algumas ruas do bairro em direção da comprida avenida que integra a zona sul da cidade ao centro, que hospedava os primeiros prédios de escritórios e de variado comércio em andares térreos, estendendo-se por galerias, esquinas e casas resistentes ao desordenado crescimento urbano.
Tendo percorrido uns dez quarteirões da artéria e já no coração da cidade, deteve-se ante a vitrine da principal loja de departamentos que abrigava marcas nacionais e estrangeiras de moda masculina e feminina no prédio de nove andares. O centro comercial fazia esquina com a igreja ao meio do quarteirão ajardinado amenizando a paisagem e atraindo transeuntes em busca de paz e perdões.
Mal começara a passar as vistas pelas tabuletas dos preços dos artigos masculinos afixadas nas peças, escutou a exclamação feminina de seu nome ali bem próxima. Virando-se defrontou a dona da voz. Os olhos nos olhos de um e de outro foram só um pouco mais rápidos do que suas falas:
- Caco?
- Isa?
As reapresentações cederam logo às relembranças de tempos e amores idos, estes possivelmente nem tanto idos quanto aqueles. Lugares morados e ocupações, casamentos e separações, descendências e emoções, alegrias e decepções. Tudo o que na calçada não dava mais para seguir com as reciprocidades levou-os para dentro, até ao elevador e para o terraço da loja de magazines, onde o restaurante panorâmico serviu de cenário para o reencontro dos amantes de antanho.
Isabel e Carlos juraram nunca mais se separarem nem deixar a cidade que um dia desunira as alianças prometidas, ali na igreja ajardinada ao lado. Pactuaram juntar-se e juntar tudo. Fechadas as contas da mesa e do passado, dirigiram-se para a sacada do prédio. O sol se preparava para o cair da tarde e na cidade acendiam-se as primeiras luzes.
Carlos e Isabel aguardaram o anoitecer e começaram a contar estrelas, admirando-as. Deram-se um beijo, as mãos e saltaram na direção delas.
Como eram lindas. Vênus, Marte, Saturno e Júpiter, Zeus de todos os céus.
Nilseu,
ResponderExcluirPuxa-vida, que prazer encontrá-lo! Essa danada pandemia distanciou todo mundo. O texto do Lélio chegou em boa hora, estou precisando de poesia para amenizar a semana áspera que tive. Se não bastasse a revolta com a conduta do Bolsonaro e dos quase 500 mil mortos, perdi um querido sobrinho e afilhado para essa maldita doença quinta-feira. Luciano tinha 51 anos, cidadão honrado, super saudável e cuidadoso com a prevenção necessária. Mesmo assim, pegou o vírus, não se sabe como, e, depois de 25 dias de agonia, morreu. Estou com tristeza e ódio. Por isto, o texto do Lélio me fez muito bem. A sua lembrança do velho amigo também. Muito obrigado.
Tenho aproveitado a pandemia e escrito algumas reflexões, em linguagem sintética, e enviadas por WhatsApp. Nada literário, muito menos poético. Hoje mandei uma que vou tomar a liberdade e encaminhá-la para você. É um tema intenso, mas, espero que goste.
Abração,
Daniel.