Recolhimento (*)..
A quarentena da lepra, dos homens, das roupas e da casa é de
sete dias, a critério do levita (Levítico). Para encontrar-se consigo mesmo,
tanto para o Filho de Deus quanto para os filhos dos homens, são necessários
quarenta dias contados, na solidão do deserto de cada um. Para, daí, abrir
passo até a Terra da Promissão, quarenta anos podem ser suficientes.
(*) Heptaédricas – 2017
Quando vem a voz inconfundível de Edith Piaf, quase sem o
discreto chiado que, indefectível, acompanha esse processo de reprodução
sonora, porque o disco, tocado pouquíssimas vezes, está “novinho”, manifesta-se
a circularidade do Tempo. Tudo poderia virar “presente” nas notas de La vie
en rose ou Hymne a l`amour, mas La goualante de pauvre Jean,
sem maiores prosopopeias, tem o condão de restaurar magias e alegrias da
infância, curiosamente atadas, não à balada de Marquerite Monnot e René
Rouzaud, mas à versão que andou em voga no Brasil, na década de 50. Ela nem foi
propriamente leal ao original, a começar pelo título, que deveria ter sido A
balada do pobre João. Veio “Os pobres de Paris”, mas a gente gostou assim
mesmo.
Voltemos à balada, ou a La Goualante du Pauvre Jean
(*):
Esgourdez rien qu'un instant
La goualante du pauvre Jean
Que les femmes n'aimaient pas
Mais n'oubliez pas
Dans la vie y a qu`une morale
Qu'on soit riche ou sans un sou
Sans amour on n'est rien du tout
Il vivait au jour le jour
Dans la soie et le velours
Il pionçait dans de beaux draps
Mais n'oubliez pas
Dans la vie on est peau de balle
Quand notre coeur est au clou
Sans amour on n`est rien du tout
(...)
Et voilà mes braves gens
La goualante du pauvre Jean
Qui vous dit en vous quittant
Aimez-vous....
(*) A balada do pobre João
Escutem por um instante
A balada do pobre João
Que as mulheres não amam mais
Mas esquecer, nãos esquecem.
Existe apenas uma moral na vida,
Ricos ou sem um tostão
Sem amor não somos nada
Ele vivia o dia-a-dia
Entre sedas e veludos,
lençóis, os mais finos.
Mas não esqueça,
Na vida nada valemos
Quando nosso coração está em farrapos.
Sem amor não somos nada
(...)
Eis aí, brava gente
A balada do pobre João
Que lhes diz ao vos deixar,
O negócio é amar...
Clero demais, muita ortodoxia,
Revolução? Não, só agitação.
1901, notícia pela ferrovia, de pasmar
O Leão (Davidovich): outro Leão,
Nikolaieivitch Tolstói, excomungado,
Por tergiversar, diziam,
Sobre a Imaculada Conceição,
Mas, alguém acha um prisma bom:
Acabou? Não, nunca acaba.
2021, pandemia, novas cepas,
novas idiossincrasias.
Mandam tomar cloroquina,
Ou estricnina, formicida Tatu,
BHC com creolina,
Bom pra chato e carrapato,
Lombriga e ameba, talvez.
Pode também rezar, o freguês,
Pra Santa Felizbina, para a imperatriz
Catarina, pra princesa Leopoldina...
Ele quase morreu de bronquite,
Salvou-o o rum creosotado.
E passa, passa, Talco Ross,
quero ver passar. Vacina?
Nem pensar. O negócio
É deixar a abobra alastrar:
Uma vez morto o rebanho
Não haverá mais pandemia,
Nem ninguém pra se lembrar
Que, um dia, existiu uma “Tabacaria”.
(NM)