segunda-feira, 26 de agosto de 2013

O tempo valioso de Mário de Andrade

Começou num botequim dos botequins de BH uma discussão ociosa sobre a fama que São Paulo tem, de exportar desastres políticos, uma grande bobagem, pois não teria pra onde exportar, dada a total auto-suficiência  quanto a esse item, em qualquer parte do território compreendido entre o Oiapoque e o Chuí. Isso pode ter origem na desastrosa experiência do janismo, alentada pela recorrência de natéis, malufes, quércias, pitas, fleurises, o delegado e o outro, etc. Mas a conversa começara, mesmo, foi com a fórmula “roubo, mas faço”, que se atribui ao governador paulista Adhemar de Barros, uma síntese do mais que perfeito cinismo universal.

Mas esse é o lado tenebroso de uma realidade que tem facetas muito mais relevantes, facetas esplêndidas, diga-se. Para um blogueiro que viveu a gala da juventude em Ribeirão Preto, muito acima da mesquinharia dos políticos paulistas e de quaisquer outras partes do Brasil, é fácil contrapor a humanidade e a arte de Euclydes, Portinari, Adoniram, da turma da Semana de Arte Moderna e de tantos outros que nos alegram e enriquecem.

Posto aqui um texto do grande Mário de Andrade (1893 – 1945), só pelo prazer de lembrar e desfrutar  do humanismo profundo, da generosidade e sabedoria de um brasileiro, de São Paulo, no caso, que nos deu a todos a referência essencial de “Macunaíma”.

O VALIOSO TEMPO DOS MADUROS

Mário de Andrade


Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora.

Tenho muito mais passado do que futuro.

Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas.

As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.

Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.

Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.

Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.

Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos.

Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral.

'As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa...

Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade,

Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade,

O essencial faz a vida valer a pena.

E para mim, basta o essencial!

4 comentários:

  1. Ainda bem que os amigos têm a gentileza de nos presentear com alertas que permitem reflexões para que nossas vidas valham a pena. Obrigado.

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  2. Muito bom!Valeu, Nilseu!

    Magda Antuña

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