sábado, 9 de maio de 2015

A fonte misteriosa das poetas

Versos de Consuelo Velazquez e de Maria Grever, damas de bolero, de Dolores Duran, dama de samba-canção, e versos de Florbela. Infeliz Florbela, tão doce e tão amável, no destino de tragédia e no tom da poesia, dama de fado.  

Bésame, bésame mucho,
Como si fuera esta noche
La última vez.
(...)
Piensa que tal vez mañana,
Estaré muy lejos,
Muy lejos de aquí.

                                                                         (Consuelo Velazquez)



Te quiero, dijiste
poniendo mis manos
entre tus manitas
de blanco marfil.

Y sentí en mi pecho
un fuerte latido,
después un suspiro
y luego el chasquido
de un beso febril.

Muñequita linda
de cabellos de oro,
 etc.

(Maria Grever)




A primeira e a última estância materializam-se em formas subjuntivas, as intermediárias vêm totalmente apoiadas numa sucessão de gerúndios que, o mais provável, seria descambar para o enfadonho, mas não é assim. O que temos é um lirismo desconcertante, lirismo de Dolores, brilhos, cores, aromas, texturas, as harmonias mais sutis do sentimento apaixonado. Ah! Dolores!


Hoje, eu quero a rosa mais linda que houver 
Quero a primeira estrela que vier
Para enfeitar a noite do meu bem 


Hoje, eu quero a paz de criança dormindo
E o abandono de flores se abrindo
Para enfeitar a noite do meu bem

Quero, a alegria de um barco voltando
Quero a ternura de mãos se encontrando
Para enfeitar a noite do meu bem

Hoje, eu quero o amor, o amor mais profundo
Eu quero toda a beleza do mundo
Para enfeitar a noite do meu bem

Quero, a alegria de um barco voltando
Quero ternura de mãos se encontrando
Para enfeitar a noite do meu bem

Ai! como esse bem demorou a chegar
Eu já nem sei se terei no olhar
Toda a ternura que eu quero lhe dar

(Dolores Duran)

Aqueles que me têm muito amor
Não sabem o que sinto e o que sou...
Não sabem que passou, um dia, a Dor
À minha porta e, nesse dia, entrou.

E é desde então que eu sinto este pavor,
Este frio que anda em mim, e que gelou
O que de bom me deu Nosso Senhor!
Se eu nem sei por onde ando e onde vou!!

Sinto os passos de Dor, essa cadência
Que é já tortura infinda, que é demência!
Que é já vontade doida de gritar!

E é sempre a mesma mágoa, o mesmo tédio,
A mesma angústia funda, sem remédio,
Andando atrás de mim, sem me largar!

(Florbela Espanca)


O&B acrescenta, um tanto arbitrariamente, uns versos de Angela, Malluh, Sônia, Adriana, Maria Cecília, Alcea, Rosinha, estas, é bem verdade, amigas do blogueiro. não para estabelecer qualquer tipo de contraponto, mas para vislumbrar a possibilidade, tentadora, de uma fonte de muitas intuições, bruxedos, sabe como é, fonte de muitos mistérios, exclusiva das poetas e comum a todas elas. Um espírito distraído pode até a achar que elas não distinguem o real de virtualidades recorrentes, sem dar-se conta de, apenas, não se preocuparem em distinguir. E, no entanto, em seu espelho de palavras, reflete-se todo o non sense das coisas e da vida!

Onde anda o luar
nesta noite escura dentro
de meu coração?
(Angela Leite em “Lição das Horas” - Editora Miguilim)

Eu saí em minha casa procurando por mim. 
No banheiro eu não estava. 
No quarto, também não. 
Talvez na quinta, num bar qualquer (...)
(Malluh Praxedes)

É no repouso da memória
que amanso minha solidão;
reviro meus recônditos,
faço leituras de mim.
Canalizo energias,
volatilizo espaços
e temporalizo rios.
Pensar é também viver
como o agricultor sedentário (*)
que semeia grãos invisíveis.
(Sônia Galastro)

(*) Referência ao rurícola da "Teoria da Viagem - Poética da Geografia" , de Michel Onfray

meça suas palavras, ele disse
medi e eram do tamanho do mundo
não cabiam mais em mim
atravessaram oceanos
e as veias quentes do corpo
saíram pelos poros em meu suor
e desapareceram
como as tardes mornas de dezembro
(Adriana Godoy - Sem rumo)

Lâmpada

Uma janela aberta,
uma lâmpada pendurada
do lado de fora
– cheia de idéias –
e nós, do lado de dentro
olhamos as idéias penduradas
do lado de fora
– cheias de janelas!
(Rosa Antuña Martins)

Entre a pele na mancha:
Repuxam esteios pelos arrepios
Que iludem espaço
Pelo avesso do senso óbvio.
Quinam-se pescoço e queixo-duplo,
Mas antes de alcançar a preguiça
Para arrancar os tecidos já mortos da mucosa
Pelo abaixo que se esteira em bubuias soltas
Formigam-lhe os tendões anestesiados.
(Maria Cecília Rodrigues Campos - In-tenso)

Às vezes não basta ser.
Às vezes ser não basta.
Às vezes precisa-se ser
duas, dez, dúzias,
para se ser uma só.
(...)
Invista em
Ser isto e aquilo
sem pressa e com estilo.
Calmamente, simplesmente,
integralmente SER.
Mulher.
(Alcéa Romano  - Mulher)

Agora sim, um contraponto, este totalmente arbitrário, de Antônio Machado:

En la mar de la mujer
pocos naufragan de noche,
muchos ao amanecer.

(NM)

4 comentários:

  1. Você entende bem as mulheres, heim, Nilseu?

    Amei! Só faltou o meu nome quando você fala "O&B acrescenta, um tanto arbitrariamente, uns versos de Angela, Sônia, Adriana, Maria Cecília, Alcea, Rosinha, estas, é bem verdade, amigas do blogueiro"...

    Meu nome deveria vir depois do nome da Angela - já que na ordem dos textos, venho depois dela...

    Gostei demais do texto da Rosinha. Filha de peixe...

    Beijinhos,

    Malluh

    ResponderExcluir
  2. Uai Nilseu,

    Pode piratear à vontade, sempre que lhe aprouver...
    Respondo ai em poema inédito, nascido nesta folha em branco.

    Depois de impressos,
    meus versos,
    já não os domino.
    Lencei-os ao vento,
    ao relento,
    pra meu alento.
    Acalento o pranto,
    o sonho, o riso.
    Insisto.
    E nem por isto
    me deixo levar
    ao abismo.
    Proponho, no entanto,
    soltar os laços,
    a largos passos,
    bater as asas
    em voos altos.
    E do espaço
    lançar palavras,
    letras miudas
    ou bem graudas,
    chovendo plenas
    como poemas.

    Alcéa (10/05/2015)

    ResponderExcluir
  3. Obrigada, Nilseu, pela lembrança. Parabéns por seu trabalho. Abraço. Adriana

    ResponderExcluir