quinta-feira, 18 de abril de 2024

Roma, colinas e reis

(XIV)

S
ete as colinas encantadas, Palatino, Quirinal, Aventino, Monte Célio, Viminal, Capitólio e Esquilino, e sete os reis que fundaram a cidade e seu império, Rômulo, Numa Pompílio, Tulo Hostílio, Anco Márcio, Sérvio Túlio, os dois Tarqüinios, Prisco, um, pela ordem, o outro, Soberbo. Coincidência? Talvez, ou capricho de nume antigo, sete ondulações telúricas sobre as quais, soberanamente, desde a dourada era de Saturno reinaram reis em número de sete, como em conjunção de astros dispostos em heptâmetros mágicos: Quem os terá composto, se Ovídio, e o Quinto Horácio Flaco, e Marcial, Lucrécio, Propércio, Lucano, Virgílio Maro... fazem parte da estância?
  

Passear por Roma é muito bom

As Sete Colinas de Roma”, 1957. O roteiro do filme parece ter saído das pranchetas de uma agência de turismo e, sem maiores preâmbulos, põe a gente a passear entre monumentos e paisagens romanos. Tem Mário Lanza com todo o seu prestígio de tenor num clima de romance com Marisa Allasio. O dueto à beira da fonte com Luisa di Meo, então uma garotinha, até hoje emociona. Canção de Renato Ascel: 

Che arrivi, t'imbevi
De Fori e de scavi,
Poi tutto d'un colpo
Te trovi Fontana de
Trevi tutta pe' te!

Arrivederci, Roma...
Good bye...
Au revoir...

Si ritrova a pranzo a
Squarciarelli
Fettuccine e vino dei
Castelli come ai tempi
Belli che Pinelli immortalò!

Outros filmes, americanos e italianos, haviam antecipado a fórmula. Assim, “A Princesa e o Plebeu” (Roman Holliday) de 1953, em que a pé, de carro ou de lambreta, o público vai atrás de Gregory Peck e Audrey Hepburn. O “Candelabro Italiano”, na década de 60, Troy Donahue e Suzane Pleshette, seguiu a toada, tem até lambreta. Porém trouxe Al di lá, no vozeirão impostado de Emilio Periccoli. Em todos, postais e mais postais, no que Roma é incomparável: Basílica de São Pedro, Piettà, Capela Sistina, a sombra do papa Júlio II, a aura de Michelangelo; San Pietro in Vinculi e o “Moisés” que o artista esculpiu, com aqueles misteriosos cornos e tudo; Castelo de Santo Angelo, o mercado dei Campo de` Fiori e, claro, o Coliseu, o Forum Romano, o Arco de Tito, o Templo de Vênus, a Basílica de Maxêncio, o Templo de Vesta...  

Sem Fossas Ardeatinas, que o horror da Grande Guerra estava presente demais, mas, sempre, as Termas de Caracala, o Palatino, e o Campidoglio, com vista direta para o Trastevere e, claro, para o próprio Tibre, Isola Tiberina, inclusa, mais a brancura do mármore no monumento a Vitorio Emanuele II, lá no alto; Piazza Navona, Piazza di Spagna, as escadarias de Trinità dei Monti, a Via dei Condotti, quanta grife, meu deus do céu, os preços, nos últimos degraus! Rente às escadarias, o Museu Keats-Shelley, que guarda memórias dos dois grandes poetas românticos no endereço em que buscaram refúgio, em vão, contra a tísica, no clima ameno da Itália.

A evocação de Roma traz muita referência, umas de puro afeto, outras nem tanto: Malaparte, Malatesta, Palmiro Togliatti, Don Camilo, Pepone, Vittorio de Sica, bicicletas, Bernardo Bertolucci, Rita Pavoni, datemi un martelo // Che cosa ne vuoi fare? // Lo voglio dare in testa, sim! E Fellini, Oito e Meio e Amarcord, La Dolce Vita (À meia-noite, com Anita Ekberg dentro, é quando mais bonita é a Fontana de Trevi), Modugno, Cos`è che trema sul tuo visino. // È pioggia o pianto, Dimmi cos` è, // Ciao ciao bambina // Non ti voltare, non posso dirti rimani ancor.// Vorrei trovare parole nuove, ma piove, piove...

“Cidade Aberta” é a Roma de Roberto Rosselini e de Ana Magnani, dela, também, a “Mamma Roma” de Pasolini, que recria na cena urbana, em tomadas emocionantes, sugestões de afrescos de Giotto, Caravaggio, Tintoretto... A Cidade comporta esse tipo de capricho, deixando sublimar com naturalidade séculos e séculos de história e arte, em projeções luminosas nas telas dos cinemas do mundo inteiro. Esses filmes dão a impressão de não buscarem revelar seus mistérios e segredos, talvez para não compartilhar com não iniciados, só deixar rolar:  inverno, as sombras da guerra presentes na noite espessa, dissimulando o indecifrável. (nm)

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Continua na próxima quarta-feira

18 comentários:

  1. Há cena mais arrebatadora em Roma do que La Ekberg na Fontana di Trevi? Inesquecível e imbatível!

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  2. Maravilha, amei, muito obrigada.
    Estou indo nesta quarta-feira para lá, foi muito bom estas lembranças, você foi perfeito, não esqueceu nada.

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    1. Obrigado por sua visita a este O&B. Tenha uma ótima viagem.

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  3. Bravo, NIlseu; bravissimo. Com todo o respeito pelos dissidentes apaixonados por outras cidades, Roma é a minha favorita - a mais bonita, emocionante e a mais "humana", se é que me entendem. Para quem ainda não viu, sugiro um dos melhores filmes passados lá e que não consta de sua lista "Para Roma com Amor", de Woody Allen, segue link https://www.youtube.com/watch?v=QciYI342304

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    1. Ô Fabbrini: a gente viu o filme que você menciona e se emocionou demais. O Woody Allen tem a sensibilidade e a manha para capturar as sutilezas da Velha Cidade. Obrigado pelo visita a O&B, pelo comentário e pelo link. Grande abraço

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  4. Roma mi incanta. Non cambierò nessun posto, nessun viaggio. Sempre Roma!

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    1. Valeu, Pier. Obrigado pela presença ilustre neste O&B. Grande abraço

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  5. José Daniel Machado24 de abril de 2024 às 06:57

    Somente hoje pude ler Roma. Que bela viagem pela Cidade Eterna você nos proporcionou, à pé, de carro, de lambreta ! Dos filmes citados, acho que não vi apenas As Sete Colinas de Roma. Que coleção de belos filmes, principalmente os do Realismo Italiano. Estive na cidade algumas vezes e pude acompanhar, mais ou menos, o passeio imaginário que o seu texto percorreu. Muito obrigado pela viagem, Nilseu.
    Abração,
    Daniel

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  6. Obrigada, Nilseu, adoro esses filmes italianos antigos...tudo de bom!

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    1. Tudo de bom pra você também, Helô. E obrigado pela visita a este O&B

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  7. Amei, Nilseu e eu adolescente, apaixonei-me por Candelabro Italiano!!!!

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    1. Não sei se é a canção, se é o clima de romance ou a magia da cidade de Roma. Objetivamente, muito suspiro.

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  8. Caro Nilseu,
    Uma explicação, em primeiro lugar: o computador brigou comigo por um bom tempo, mas fizemos as pazes, daí estar de novo com você.
    Segundo, um agradecimento: você me proporcionou uma caminhada imaginária pela Roma Eterna, uma cidade realmente incomparável, onde se pode saltar de um monumento a outro, cada registro artístico ou histórico nos causando a maior emoção. É um museu vivo, para se ver e sentir tantas vezes quanto forem as oportunidades de cada um de nós. Continuemos, então, nessa jornada romana. Pode até ser cansativo, mas o ganho atinge o fundo da memória, para a vida inteira.
    Um afetuoso abraço.
    Ariosto

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    1. Que bom você de aqui neste O&B, Ariosto. Compartilhar esses breves registros mnemônicos com uma sensibilidade como a sua é o que eu posso chamar de "tudo de bom".

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